Mês de julho, mês do famoso Passeio a Serra, se não o mais antigo, com certeza um dos mais antigos passeios ecológicos do Brasil, que ocorria geralmente no segundo sábado, quando amantes da natureza madrugavam e se dirigiam a Serra São José para contemplar as belezas da nossa montanha.
Para relembrar os primórdios deste passeio, fomos beber na fonte do grande pradense e historiador Dario Cardoso Vale, que em seu livro: Memória Histórica de Prados, capítulo XVIII, nos oferece informações magníficas sobre este passeio, acompanhado de poemas que nos fazem relembrar os caminhos outrora percorridos pelas famílias pradenses.
“ Alguns de nossos incorrigíveis folgazões promovem, para ser realizado, geralmente, no mês de julho de todo ano, o costumado passeio à Serra. Esta como um leão bravo, envolta em seu manto azul negro que o tempo ainda não conseguiu desbotar, infunde o colosso quase que receio a quem a mira de alguma distância. Mas o aspecto se lhe muda, à vista de quem lhe sobe ao dorso, áspero sim, mas coberto de uma bem esquisita vegetação, que lhe ameniza a aspereza e agrada o visitante. Por muitas vezes já miramos lá de cima de sua corpulência colossal um panorama agradabilíssimo, ponteado aqui e alí de brancas povoações ao longe, eriçado de montes multiformes, repleto enfim, de quadros muito variados, onde a natureza se ostenta luxuriante e pródiga.
É assim que o povo mais antigo costumava poeticamente contar a história dos primeiros Passeios à Serra: “ Madrugada silenciosa. As estrelas ainda piscavam no céu. Os bravos excursionistas partiram. A tiracolo levavam os farnéis recheados de gostosa matalotagem, e, na alma a boa disposição de passarem um dia longe da cidade , no alto da Serra, mais perto de Deus. Partiram e, segundo a direção preestabelecida, sempre para cima, escalando pedregosas rampas e ínvios vales, coleando corajosamente o dorso áspero da imponente montanha, alcançaram suados mas vitoriosos, o grande planalto, meta do seu roteiro. E pasmaram diante do espetáculo incomparável. O horizonte, em todo o seu imenso círculo e a léguas de distância, desaparecia envolto na tênue bruma da manhã. Por toda parte, os olhos se maravilhavam diante do panorama de colorido diverso, na ondulação sem fim dos campos, por cujos meandros aqui e além brilhavam as águas do lendário Rio das Mortes e de riachos que serpenteavam em graciosas curvas. Sobre o leito do Rio e na superfície do aço polido de algumas das lagoas, subia preguiçosamente, finíssima gaze de vapor, que fazia da paisagem o caleidoscópio dos reinos das fadas.”
O passeio, nasceu, como dizem os mais antigos, da idéia original de um casal de noivos que resolveu quebrar a tradição de bailes casamenteiros, realizando sua recepção ao ar livre, no alto da montanha. Casava-se Dª Chiquinha ( Francisca de Paula Gonçalves) com Antônio Gonçalves dos Reis e Silva ( Tonico Reis ) , em 18/04/1888. A família, no dia do seu casamento, mandou transportar para o alto da Serra, violinos, violões, doces e salgados para a festa. Os convidados lá se reuniram, dançaram e cantaram. Desde este tempo, por tradição, todos os anos se faz este passeio, porém, não no mesmo mês originário.
A preparação do passeio era feita pelos cidadãos mais antigos que “sabem melhor como as coisas dever ser feitas” A Banda de Música local costumava ensaiar alguns dias antes, as músicas que seriam tocadas durante o passeio: “ Buquê de pensamentos” e o “ Tico-Tico” especialmente compostas pelo já falecido maestro Antônio Américo. Atualmente alguns músicos, não toda a Banda, tocam aquelas músicas tradicionais. Na véspera do passeio, há concentração na praça principal da cidade ( praça Dr. Viviano) onde alguns ainda discutem os preparativos da escalada. Ninguém dorme direito, tal a expectativa. Ás 4 horas da madrugada, há a alvorada com música e foguetes. Ás 5 horas iniciam a caminhada rumo a biquinha fonte que há no sopé da Serra, de onde se parte, para escalar a montanha, levados sempre por um guia, daí é que os participantes iniciam, propriamente, o passeio. Alguns preferem subir na véspera e dormir acampados no alto do morro, onde é preciso acender fogueira em pontos estratégicos, para afastar lobos e outros bichos que rondam o acampamento.
No vasto planalto que se lhe estende na sua quase extremidade, lá esta ainda, a pedra não perece, a grande lage lisa, branca, sobe a qual os farnéis, com o fogo alimentado pelo gravatá aquecem e se tornam apetecíveis. Em volta, os pequenos e improvisados bancos de granito, onde não mui comodamente assentados, tomam os excursionistas, às 9 horas da manhã a sua primeira refeição do dia, pois que a segunda é distribuída ao sopé do monte, juntos à biquinha de água cristalina, frígida e muito boa, quando o sol, descambando para o ocaso, lança-nos uns últimos e já mornados raios. E o nosso espírito sente-se bem ali, com as sensações que experimenta ao ouvir a música, indispensável no passeio, a torna-las mais vivas, coloridas e mais intensas. O frio é intenso, a neblina baixa, mas os alpinistas, geralmente, levam roupas de lã grossa e protetores de ouvido. O panorama que se descortina lá do alto é tão bonito que compensa todos o esforço da subida.
Dizem que antigamente os excursionistas se reuniam na “biquinha” para que antes de regressarem à Cidade, pudessem dançar a “quadrilha” e também ter a oportunidade de ouvir alguns poetas declamarem suas poesias inéditas, como, por exemplo, os belos e significativos poemas que ora transcrevemos:
SAUDADE DA SERRA
Poesia Pradense – José Américo da Costa/Julho de 1930.
“Por isso caros leitores, se passardes um dia ao sopé desse gigante amigo e abandonado, não vos cause surpresa se ouvirdes, saída das entranhas dessa pedras milenares, trazida pelos ventos, a
“ SERRANA ENDECHA”
Quando da volta, concentravam-se nas imediações das bicas do “ Narciso” para retornarem em conjunto ao centro da cidade, ao som de o “ Tico-Tico” e da quadrilha “ Artur Oscar” composições do maestro Antônio Américo.
De episódios interessantes já esta cheia a crônica da excursão à Serra. Certo que as gerações que hão de seguir, não lhe porão ponto final, enquanto alí, mirando o vale, como um leão irado e em seu manto azul negro que o tempo ainda não desbotou, existir erecta a Serra, essa mesma Serra que, com a sua voltada para Prados, será uma eterna balisa que determina a direção em que se encontra escondida entre as colinas, a nossa pequena urbe.
É um passeio agradável e um grande prova de resistência física, já que para se galgar o cume da Serra, leva-se meia hora, pelo menos”.
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